terça-feira, 30 de agosto de 2011

Porque os juros elevados prejudicam a classe trabalhadora

O Brasil possui uma das maiores taxas de juros do mundo, 12,5%, mas quando o jornal televisivo noticia que o governo aumentou ou reduziu a taxa de juros, muitas pessoas se perguntam o que isso influencia nas suas vidas. Isso porque o máximo de informação que o jornal transmite é que foi uma medida econômica adotada para controlar a inflação. Compreende-se que a notícia dada dessa forma diminui a possibilidade de questionamento porque foi uma medida tomada com o intuito de controlar a inflação e toda a sociedade é a favor desse controle. Porém, a questão é um pouco mais complexa.


Os juros do Banco Central, conhecidos também como taxa selic, servem de parâmetros para os investimentos internos realizados pelas empresas. Quando eles são altos as empresas repassam os percentuais para os preços dos produtos e eles se tornam mais caros para os consumidores, inibindo o consumo. Por isso o aumento dos juros é a principal alternativa neoliberal para o controle da inflação. No entanto, esse aumento é responsável por diversas consequências desastrosas para a classe trabalhadora.



Primeiro é preciso ressaltar que o controle da inflação a partir do aumento da taxa de juros é uma receita do conservadorismo neoliberal. Quando o neoliberalismo foi aprofundado no país, na década de 1990, a principal medida para o controle da inflação era o aumento da taxa de juros, que chegou a 45% em 1999. Aliadas ao câmbio flutuante e as metas de superávit primário, as altas taxas de juros estão entre as principais responsáveis pela falta de desenvolvimento econômico e social do país.



Os juros altos do Brasil atraem muitos dólares de investidores internacionais para o país, mas é um dinheiro que não é traduzido em produção porque é aplicado no mercado financeiro ou especulativo. É um tipo de investimento de curto prazo que não tem preocupação com o investimento produtivo, mas apenas com a obtenção de altos lucros. O investidor ao invés de construir uma industria de sapatos, por exemplo, que gera emprego na própria empresa e em outros setores e dinamiza a economia, opta por ter uma rentabilidade maior e em menos tempo através do mercado financeiro e não ter que se preocupar com a infraestrutura da fábrica, contratação de trabalhadores, comercialização do produto e ainda esperar um determinado período para começar a ter lucro. Por isso os juros altos desestimulam o investimento industrial e incentivam o capital especulativo. Isso faz com que menos empregos sejam gerados porque indústrias deixam de ser instaladas no país, contribuindo para a manutenção ou aumento dos índices de desemprego.



O pagamento das altas taxas de juros pelo governo brasileiro também se constitui como um problema importante enfrentado pelo Estado porque é um dinheiro que deixa de ser investido em bens de consumo coletivo como saúde, educação, previdência, seguridade, assistência, habitação, saneamento, para ser destinado ao enriquecimento daqueles que aplicam no mercado financeiro, que são os que compõem a classe rica deste país. Atualmente, o Brasil paga de juros o equivalente a 6% do seu Produto Interno Bruto (PIB). Esse valor seria suficiente para cobrir os custos de 15 Programas Bolsa Família. O pagamento dos juros beneficiam menos de 1% da população brasileira e o Bolsa Família atende mais de 50 milhões de pessoas.



As altas taxas de juros têm uma influência direta na vida das pessoas porque é responsável pelo direcionamento do dinheiro que seria investido em bens de consumo coletivo e na melhoria da qualidade de vida da população, principalmente através da geração de emprego e renda, mas é destinado ao enriquecimento de um grupo acostumado com os privilégios sociais, que são os ricos deste país.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O Brasil tem que investir na industrialização

A crise do capitalismo na década de 1970 instaurou uma conjuntura internacional que foi utilizada pelos liberais para tornar seu modelo novamente hegemônico no sistema capitalista. Países como o Chile, Estados Unidos e Inglaterra foram os primeiros a adotarem o novo modelo liberal, denominado de neoliberalismo. No início da década de 1980 a política neoliberal já estava presente nas principais nações mundiais, pregando a regulação da economia pelo mercado e o Estado mínimo.



A agenda de reformas liberalizantes começou a chegar no país a partir de 1990, com a eleição de Collor e através do Plano Nacional de Desestatização (PND). O país enfrentava diversos problemas estruturais provocados principalmente pela etagnação econômica. Com a eleição de Fernando Henrique Cardoso o neoliberalismo foi aprofundado no país e as condições da classe trabalhadora foram cada vez mais sendo desrespeitadas porque o intuito do governo era desregulamentar e flexibilizar ao máximo as relações de trabalho para enfraquecer os sindicatos e fazer com que o mercado regulasse os salários através da oferta e demanda por postos de trabalho. As privatizações das estatais, feitas em grande parte com o dinheiro público do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), foi uma medidas do governo de FHC que demonstrou que ele não visualizava o Estado como o grande responsável pelo investimento produtivo, capaz de gerar emprego, evolução da renda do trabalho e dinamismo na economia.



Após o acordo do governo brasileiro com o FMI, em 1998, a política neoliberal tomou vigor principalmente através das medidas econômicas baseadas no superávit primário, no câmbio flutuante com a moeda brasileira valorizada em relação ao dólar e no aumento dos juros do Banco Central como principal medida para controlar a inflação. Esse conjunto de ações econômicas aliadas as privatizações e as terceirizações da mão-de-obra fizeram com que fosse aprofundado o processo de precarização do trabalho, com que o investimento especulativo (financeiro) fosse mais atrativo que o investimento produtivo (industrial) e com que as importações fossem mais baratas que as exportações. Todas essas consequências prejudicaram a indústria nacional e fizeram com que a informalidade e o desemprego aumentassem consideravelmente no país até o final do governo de FHC. Em 2003, a taxa de desemprego aberto atingiu o pico de 13,4%.



O governo Lula não obteve uma herança muito positiva tanto do ponto de vista econômico quanto do social. Porém, manteve a mesma política econômica do governo FHC e não fez reformas importantes como a tributária e a da previdência, mas teve a posição política de investir em alguns setores da economia que foram capazes de gerar emprego e renda, além de integrar políticas sociais com programas de qualificação profissional que foi fundamental para a preparação técnica dos trabalhadores. Em 2005, o desemprego aberto já havia recuado para 9,5%, no entanto, apenas a partir de 2007, com o lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) o país começou a crescer num patamar maior e a gerar mais emprego e renda. Apesar de não ter havido a privatização de grandes empresas no governo Lula, até porque não havia mais tanta empresa estatal para ser privatizada, também não houve a criação de grandes empresas públicas, mas o fortalecimento de algumas já existentes como a Embraer e a Petrobras, ambas de capital misto. Isso faz com que o Brasil continue dependente do capital privado para dinamizar sua economia, coordenar o investimento produtivo e pautar sua atuação em indústrias que agreguem tecnologia de ponta.


Mudanças importantes


De 2004 a 2008 aconteceram algumas mudanças importantes no mercado de trabalho e que merecem destaque. Houve uma redução da taxa de desemprego e a expansão do emprego formal; cresceu o emprego na grande empresa e no setor público; o número de trabalhadores informais foi reduzido, assim como o trabalho assalariado sem carteira assinada; houve o aumento do valor real do salário mínimo e a recuperação do valor real dos salários negociados, além da redução do trabalho infantil e análogo ao escravo; também houve uma elevação do rendimento médio dos trabalhadores. São dados que caracterizam a reversão da situação em algumas tendências históricas do mercado de trabalho, mas apontam para a necessidade de que muitas transformações ainda precisam ser realizadas, principalmente no que diz respeito as relações de trabalho, como a redução da jornada sem redução de salário, a reforma sindical, a reforma da previdência e a flexibilização e desregulamentação das relações trabalhistas. São alguns enfrentamentos que ainda precisamos fazer com relação ao modo de produção capitalista.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Debate da 9ª Plenária da CUT-BA aponta caminhos para o desenvolvimento

A coordenadora do Dieese na Bahia, Ana Georgina, defende durante a 9ª Plenária Estadual da CUT-BA que as categorias devem lutar por ganho real nas negociações coletivas deste segundo semestre. Ela afirma que a classe trabalhadora não está tendo um reajuste acima da produtividade. Além disso, reafirma ainda que os reajustes salariais não são os vilões da inflação, mesmo porque, neste momento, numa economia internacionalizada a relação com a inflação é principalmente influenciada pelas commodities (soja, petróleo, trigo) e a proteção da renda dos trabalhadores e trabalhadoras é a política mais acertada porque mais de 60% da economia brasileira é sustentada pelo consumo da classe trabalhadora. O desenvolvimento do país passa por uma política de Estado capaz de avançar nas propostas da classe trabalhadora, que abrangem os diversos setores do Brasil e apontam para um compromisso social amplo.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Começou a 9ª Plenária Estadual da CUT-BA




A 9ª Plenária Estadual da CUT-Bahia Eduardo Bonfim teve início nesta quinta-feira, 25, com a Plenária de Formação Eliane Oliveira, no auditório do Grande Hotel da Barra, em Salvador. No evento foi apresentado o balanço das atividades de formação desde 2009 e os integrantes do coletivo de formação da CUT-BA receberam o certificado de participação do curso de Formação de Formadores Dirigentes (FFD). Diversos sindicatos cutistas de todo o estado participaram da Plenária de Formação, que foi a preparação para a abertura oficial da 9ª Plenária Estadual, que aconteceu à noite e contou com a participação de parlamentares e do presidente do Partido dos Trabalhadores na Bahia. O evento vai até o dia 27/08 e irá debater propostas para o desenvolvimento do país e a melhoria da qualidade de vida da classe trabalhadora, além de tirar delegados e delegadas para a 13ª Plenária Nacional da CUT que acontecerá dos dias 03 a 07/10, em São Paulo.

Denúncias sobre a empresa Grenit

O Ambiente Sindical recebeu diversas denúncias dos trabalhadores e trabalhadoras da empresa de call center Grenit. Verificamos as informações e todas as denúncias foram comprovadas. O maior número de reclamações diz respeito a saúde do trabalhador. O pessoal que trabalha na Grenit só pode entregar atestado médico se este vier acompanhado de relatório para comprovar a doença. Além disso, os atestados de comparecimento também não estão sendo aceitos pela empresa e quem apresentá-los terá o dia da falta cortado. Mas há dois casos que também são considerados graves: o funcionário ou funcionária que se atrasar mais de duas vezes no mês, mesmo que seja por alguns minutos e por qualquer motivo, fica impedido de trabalhar e tem o dia cortado; outro caso é que as pessoas que estavam em férias este mês tiveram que retornar ao trabalho de forma autoritária e sem qualquer garantia trabalhista. O call center presta serviços para o Banco do Brasil, que também tem a responsabilidade de fiscalizar a Grenit e resolver as questões. O movimento sindical tem que combater esse tipo de prática e não pode permitir que a classe trabalhadora continue passando por esse tipo de situação.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Não há mais desculpas para descumprimento da Lei 11.738

A decisão (acórdão) do Supremo Tribunal Federal, publicada no Diário da Justiça de 24 de agosto de 2011, sobre o julgamento de mérito da ação direta de inconstitucionalidade (ADIn 4.167), torna inconteste qualquer opinião que desafie a constitucionalidade e a aplicação imediata da Lei 11.738 (Piso do Magistério), sobretudo quando observados os esclarecimentos do Tribunal na ementa da decisão, assim dispostos:

1. Perda parcial do objeto desta ação direta de inconstitucionalidade, na medida em que o cronograma de aplicação escalonada do piso de vencimento dos professores da educação básica se exauriu (arts. 3º e 8º da Lei 11.738/2008).

2. É constitucional a norma geral que fixou o piso dos professores do ensino médio com base no vencimento, e não na remuneração global. Competência da União para dispor sobre normas gerais relativas ao piso de vencimento dos professores da educação básica, de modo a utilizá-lo como mecanismo de fomento ao sistema educacional e de valorização profissional, e não apenas como instrumento de proteção mínima ao trabalhador.

3. É constitucional a norma geral que reserva o percentual mínimo de 1/3 da carga horária dos docentes da educação básica para dedicação às atividades extraclasse.

Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. Perda de objeto declarada em relação aos arts. 3º e 8º da Lei 11.738/2008.

Em suma: o acórdão declara a Lei do Piso totalmente constitucional e reforça as orientações da CNTE condizentes à sua correta aplicação, recentemente divulgadas no jornal mural especial sobre o PSPN.

Com acórdão do STF, Lei do Piso deve ser imediatamente aplicada em todo o país.

Sobre a possibilidade de, nos próximos cinco dias, algum gestor público interpor embargos de declaração à decisão do STF, alegando possíveis obscuridades, contradições ou omissões no acórdão, a CNTE esclarece que essa ação (muitas vezes protelatória, e única possibilidade de recurso ao julgamento) não suspende a eficácia da decisão. Ou seja: a Lei 11.738 deve ser aplicada imediatamente.

Importante reforçar que, para quem deixar de vincular (no mínimo) o piso nacional aos vencimentos iniciais de carreira, os sindicatos ou qualquer servidor deverão ingressar com Reclamação no STF, bem como denunciar os gestores, descumpridos da Lei, por improbidade administrativa.

Em relação à hora-atividade, a falta de eficácia erga omnes e de efeito vinculante à decisão não dispensa o gestor público de observá-la à luz do parágrafo 4º do art. 2º da Lei 11.738, uma vez que o dispositivo foi considerado constitucional pelo STF. Nestes casos, a cobrança do cumprimento da Lei deverá ocorrer perante o judiciário local. (CNTE, 24/08/11)


Notícia retirada do site da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação em 24/08/2011.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

As crises são constitutivas do capitalismo

A primeira compreensão que devemos ter quando debatemos o capitalismo é que ele é um sistema onde as crises são constitutivas do seu funcionamento. Não há capitalismo sem crises. A outra compreensão que devemos ter é como o capitalismo se organiza do ponto de vista estrutural. Para visualizarmos isso é preciso entender a composição técnica ou orgânica do capital, ou seja, como o capital fundamenta suas referências para ter a capacidade de acumulação e reprodução dentro da sociedade. Tentarei explicar em poucas palavras como esse processo acontece e como ele responde porque a crise da década de 1970 se abate com mais intensidade nas economias capitalistas mais avançadas.

No processo de acumulação do capital, uma parte é capital constante (meios de produção) e a outra parte é capital variável (força de trabalho). Sendo assim, a composição técnica do capital é dada pela relação entre os meios de produção e a força de trabalho. O capitalismo é justamente o responsável pela transformação dessa relação através da tecnologia e qualificação do trabalho, tornando-se um sistema de reprodução ampliada. Neste sentido, as constantes transformações ocorridas na composição técnica do capital se configura como um processo de destruição criadora, onde o pretérito tem que ser transformado pela incorporação da tecnologia. A tendência na composição técnica do capital é que o capital constante se eleve numa proporção superior ao capital variável, justamente porque a implementação da tecnologia faz com que os meios de produção sejam potencializados e a força de trabalho seja reduzida. Se os dois crescessem na mesma proporção haveria um cenário de pleno emprego, mas a lógica do sistema capitalista é operar abaixo do pleno emprego para que ele tenha o controle da oferta e demanda por postos de trabalho. É importante ressaltar também que os dois pilares fundamentais para a mudança da composição técnica do capital são a concorrência e o crédito. Eles são as molas propulsoras do investimento da grande empresa, que é a unidade de produção do sistema capitalista.

Podemos pensar ainda que há uma certa contradição nessa lógica, que penaliza a classe trabalhadora. O trabalhador produz e reproduz a sua própria forma de exploração, produzindo tecnologia e gerando a mais-valia para que o capitalista possa adquirir mais tecnologia e ir substituindo o trabalho vivo pelo trabalho morto (máquinas). Porque a receita básica do capitalismo é a aplicação do capital, mais os meios de produção, que gera mais capital. É a partir dessa perspectiva que ele se reproduz e se não houver a etapa dos meios de produção e o capital gerar mais capital sem ter a necessidade de ter máquinas, mão-de-obra e infraestrutura há o alcance do cenário ideal para o capitalismo. Agora chegamos ao ponto que queríamos.

A crise da década de 1970 foi construída historicamente e podemos considerar como um marco importante o período a partir da Segunda Guerra Mundial, quando a ajuda norte-americana a alguns países europeus e ao Japão, através do plano Plano Marshall, com o objetivo de ganhar espaço na disputa com o comunismo e aumentar o seu mercado consumidor, proporcionou o crescimento desses países, que na década de 1960 começaram a disputar espaço com os norte-americanos e a construir um mercado financeiro forte fora dos EUA, gerando uma liquidez de dólar no mercado internacional. Esse processo levou os EUA a estabelecer a inconversibilidade do padrão dólar-ouro, em 1971 e, posteriormente, a situação foi agravada pela crise do petróleo, em 1973, que fez com que houvesse um descontrole da taxa de câmbio e do fluxo de capitais e como já havia uma gobalização das relações de mercado naquele período, a crise afetou diretamente a diversos países que dependiam em grande escala das importações dos EUA, principalmente os mais desenvolvidos, que negociavam grande parte dos seus produtos com o maior mercado consumidor do mundo. Como foi dito no início desse texto, as crises são constitutivas do capitalismo e mesmo as grandes potências econômicas mundiais não estão blindadas.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Companheira Eliane deixará saudades

A companheira Eliane Oliveira, 32, coordenadora nacional de juventude da Federação dos Trabalhadoras e Trabalhadores da Agricultura Familiar (FETRAF) faleceu esta tarde num acindente de moto quando estava indo para o município de Barroca Funda, no interior da Bahia. A sociedade e o movimento sindical perdeu uma eterna guerreira da luta pela classe trabalhadora e especial pelos trabalhadores e trabalhadoras rurais. A nossa eterna companheira descansará em paz e a família terá o conforto necessário para suportar a dor dessa grande perda.


Parabéns Eliane pela história de luta e por tudo que você construiu como mulher, filha, mãe e trabalhadora rural.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Precisamos de um projeto de industrialização

A primeira questão na discussão sobre a industrialização do Brasil é compreender que esse processo é uma construção histórica e política. A partir daí é possível perceber como o país atravessou momentos de considerável crescimento econômico, mas não foi capaz de converter os benefícios desse crescimento em desenvolvimento social. Entre 1930 e 1980 o Brasil foi o país que acumulou os maiores índices de crescimento, mas as decisões políticas fizeram com que se tornasse um dos países com as maiores desigualdades sociais do mundo. Mesmo o dinamismo e a mobilidade social ao longo desses anos não resultou na redução dessas desigualdades.



A partir da década de 1920 o Brasil transitou de uma economia agrário-exportadora para uma economia industrial capitalista. A força econômica do período cafeeiro foi responsável por iniciar uma infraestrutura, ainda precária, mas que era preciso para o escoamento da produção. Grande parte do resultado da economia cafeeira era investido no meio urbano e fez como com que algumas cidades adquirissem uma estrutura diferenciada em relação as demais que não tinham o café como um dos principais produtos da economia. Com a Grande Depressão de 1929 o café mergulhou numa crise que lhe roubou a primazia de que gozava, mesmo com as medidas adotas pelo Estado para contê-la. A chegada de Getúlio Vargas ao poder em 1930 teve como um dos objetivos principais o combate ao poder político dos cafeicultores e iniciar um processo de industrialização a partir da siderurgia, exploração de petróleo, energia hidrelétrica e, mais tarde, da indústria de máquinas e equipamentos. Vale ressaltar que o processo de industralização brasileiro tem uma herança escravista, aristocrática e sem reforma agrária. Por isso possui característas peculiares em relação ao processo de industrialização de outros países. Além disso, o Brasil não participou da primeira revolução industrial, iniciada na Inglaterra. Portanto, houve uma industrialização tardia no país.


Outro ponto importante a ser ressaltado está relacionado ao fato de que o Brasil ficou de fora do Plano Marshall, que foi instituído pelos EUA após a Segunda Guerra com o objetivo de reconstruir alguns países, principalmente os europeus, favorecendo diretamente o desenvolvimento do setor industrial. Pois bem, o processo de industrialização iniciado com Getúlio teve continuidade com Juscelino Kubitschek com implantação do Plano de Metas, que privilegiou especialmente a indústria automobilística e que também movimentou o setor de serviços, peças e equipamentos. No período do governo de Juscelino houve uma profunda modificação na estrutura industrial, alterando as relações inter-setoriais em favor de bens de produção e do setor de bens duráveis. A grande questão é que na proposta de Juscelino apenas o desenvolvimento econômico daria conta dos problemas sociais do país, mas isso não aconteceu. Juscelino não foi capaz de associar o desenvolvimento econômico ao desenvolvimento social.


Os militares deram continuidade ao processo de industrialização e setores como a metalurgia, mecânica, material elétrico e de comunicações, química e material de transporte pesado, passaram a ter uma participação importante no Produto Interno Bruto do país. O Brasil chegou em 1980 com um desenvolvimento econômico que superava a China, a Índia e a Coréia do Sul e só não era superior aos países líderes do desenvolvimento capitalista mundial (EUA, Japão, Alemanha Ocidental, França, Inglaterra) pela inexistência no Brasil de uma multiplicidade de indústrias de "ponta" na área de bens de capital (industria de máquinas seriadas, computadores, máquinas de controle numérico e etc. ). Durante o período da ditadura militar a dívida externa brasileira também cresceu de forma elevada tanto por conta dos empréstimos do setor privado como dos empréstimos adquiridos pelo gorverno. O sistema financeiro também atendeu com eficiência as necessidades de crédito corrente para a produção e consumo.


Um último ponto que gostaria de ressaltar é com relação ao processo de desindustrialização do Brasil, iniciado durante o governo Collor e que foi dado continuidade com bastante empenho no governo de Fernando Henrique Cardoso. Esse processo se deu principalmente pela falta de interesse desses governos em construir novas indústrias e pela privatização das empresas estatais brasileiras. Portanto, se com o investimento produtivo e o crescimento do país não houve uma política de inclusão e redução das desigualdades até a década de 1980, a partir do governo Collor e no governo de FHC o abandono do projeto de industrialização aprofundou as desigualdades, especialmente porque não havia mais o dinamismo e a mobilidade social que existia até a década de 80, quando a industrialização era o principal motor do desenvolvimento do Brasil.


O grande desafio do governo atual é retomar esse processo de industrialização através do investimento produtivo, que foi iniciado timidamente no governo anterior principalmente com a indústria petrolífera e naval, para que possa ser gerado emprego e renda por conta do efeito multiplicador. O Estado deve ser o coordenador desse processo e tem que começar a adotar medidas cambiais para proteger a indústria nacional, incentivar o investimento produtivo e desestimular o investimento no capital financeiro. Paralelo a isso o Estado também deve investir em pesquisa e tecnologia, privilegiando o processo educativo para que deixemos de ser um país dependente de tecnologia importada.








Viva a Marcha!

A Marcha das Margaridas é uma ação estratégica das mulheres do campo e da floresta para conquistar visibilidade, reconhecimento social e político e cidadania plena. O ato está acontecendo agora, no Parque da Cidade, em Brasília, e é super importante para reduzir as desigualdades e ampliar as políticas públicas para as mulheres.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Teoria e prática no movimento sindical

O movimento sindical brasileiro vive um momento único desde a posse do ex-Presidente da República Luis Inácio Lula da Silva, em 2002. Após anos de luta pela democracia, durante a ditadura, e pela eleição de um presidente que fosse oriundo da classe trabalhadora, o movimento sindical se deparou com um processo de aperfeiçoamento das suas práticas e que colocou em debate a sua própria autonomia.



Oito anos se passaram e o movimento sindical se deparou com a primeira disputa eleitoral sem a presença do ex-operário e sindicalista como figura principal, após a redemocratização do país. A vitória da atual Presidente deve ser o momento do sindicalismo brasileiro começar a repensar a sua atuação e capacidade de mobilização. Já que esse é um processo que deve acontecer constantemente, principalmente quando há uma mudança na Presidência da República, mesmo que essa mudança represente a continuidade de um projeto político.



O debate de concepção sindical precisa ser realizado periodicamente, mesmo porque o processo de produção dentro do sistema capitalista também está sendo aperfeiçoado com frequência. Não dá para fazer sindicalismo sem reforçar as concepções e renovar as práticas. A mais recente prova disso foi as centrais sindicais ter perdido o debate político para o Governo Federal com relação ao reajuste do salário mínimo, que é a maior negociação coletiva do Brasil. Mesmo perdendo o debate, esse foi um processo que beneficiou o sindicalismo no Brasil porque devolveu ao movimento sindical um pedaço da outra parte da responsabilidade sobre a luta da classe trabalhadora. A autenticidade do movimento sindical brasileiro sempre se deu através da sua capacidade de enfrentar as mudanças conjunturais e rediscutir os seus modelos de atuação.



Agora é outro momento de pôr essa capacidade em prática. Já que me refiro a um sindicalismo que defende os interesses da classe trabalhadora; que amplia o debate para além do corporativismo; que possibilita a participação e respeita a decisão da sua base de atuação; que é independente e tem a capacidade de decidir sobre a sua forma de sustentação financeira; que é autônoma e não segue orientação de partidos, agrupamentos políticos, credos, religiões e quaisquer organismos de caráter programático e institucional; que garante a pluralidade do debate e da participação na estrutura sindical, respeitando as diferenças físicas, de gênero, cor, orientação sexual, religião, geração e outras. A concepção e a prática devem ser aperfeiçoadas no movimento sindical brasileiro.



Texto publicado no jornal da Associação Comercial e Industrial de Alagoinhas, edição nº 4, de março de 2011.

Uma breve análise dos regimes autoritários na América Latina

Países da América Latina como Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Peru e Uruguai foram governados por regimes autoritários durante décadas do século XX e esse modelo burocrático-autoritário influenciou diretamente no processo de desenvolvimento econômico e social adotado pelas nações durante os regimes. Foram regimes que tiveram em comum o rígido controle dos comandos militares, que eliminaram a disputa por porder dos partidos livremente organizados, da mesma forma em que reprimiram qualquer tipo de ideologia que pudesse configurar-se como mobilizadora e que fosse de encontro aos interesses do regime. Mas um outro ponto importante que deve ser destacado durante os regimes autoritários foi que a política de desenvolvimento implantada em cada país não dependeu da forma do regime, mas do pensamento que era hegemônico no período, que era o pensamento da classe dominante, ou seja, não foram alteradas as bases de dominação social e não houve políticas públicas de inclusão de classes e grupos integrantes da estrutura básica de dominação. A burguesia continuou ditando as regras do jogo de acordo com os seus próprios interesses.


Ao tomar como referência a distinção realizada com relação ao conceito de países periféricos, estudiosos da CEPAL também abordam a questão sob a perspectiva do capitalismo periférico, que também foi o modelo sistematizado nos países da América Latina que estavam sob o regime autoritário. Neste sentido, os problemas da democracia na região devem ser abordados a partir de uma análise dos mecanismos fundamentais que regiam a estrutura e o funcionamento do capitalismo periférico. Uma das principais problemáticas econômicas dos países sob o regime autoritarista na América Latina foi justamente a falta de dinamismo da economia, que estava fundamentada na produção de bens primários que exigia na maioria das vezes uma baixa qualificação profissional. Como a demanda por emprego crescia num ritmo bem maior que a oferta, a partir do momento em que os setores modernos iam absorvendo mão-de-obra, tanto nas tarefas mais simples quanto nas que exigiam uma qualificação crescente, os salários não se elevavam na mesma proporção que os respectivos aumentos da produtividade. Em consequência, quando a distruição da produtividade não é revertida em ganho salarial para os trabalhadores, tendem a concentrar-se nas mãos dos proprietários dos meios de produção em forma de excedente, proporcionando o processo de concentração do capital. Isso explica porque o subemprego e o desemprego, traços específicos do capitalismo periférico, têm sua origem estrutural no excedente. Os regimes autoritários na América Latina não exerceram uma política pública com a intenção de reverter essa situação porque a doutrina hegemônica foi a da classe dominante, que não possui no seu projeto o propósito de reverter o processo de exploração da classe trabalhadora, e mesmo com a queda dos regimes e o estabelecimento da democracia o cenário não foi modificado no cone sul do continente.


A expansão do capitalismo nos países periféricos acentuou as desigualdades por conta da má distribuição de renda e dos bens de consumo coletivo como educação, saúde, lazer e habitação. A renda e o bem-estar não se estenderam aos vastos setores da população, tanto urbanos como rurais, e foram destinados a satisfazer as necessidades dos estratos privilegiados da sociedade, ou seja, os mais ricos, excluindo dos seus benefícios uma proporção considerável do conjunto da população.


Portanto, em qualquer forma de governo, principalmente na democracia, um dos pilares mais importantes para que seja garantida a ampliação do acesso aos bens de consumo coletivo é a hegemonia do proletariado. Somente com a hegemonia do projeto da classe trabalhadora será possível a ampliação de direitos e a construção de uma sociedade menos desigual e com uma melhor qualidade de vida para as pessoas. Todas as diferenças e processos discriminatórios existentes na sociedade devem ser percebidos, mas a essência da disputa de hegemonia está na luta de classes.



sábado, 13 de agosto de 2011

Alguns pensamentos da CEPAL

A Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (CEPAL) sempre se posicionou a partir de uma mensagem central, a da necessidade de realizar políticas de industrialização como forma de superar o subdesenvolvimento e a pobreza. A instituição foi fundada em 1948 e no mesmo ano começou a funcionar a partir do desenvolvimento de teorias próprias para a América Latina, com inovações conceituais acerca de aspectos relevantes sobre uma parte da América que ainda estava engatinhando com relação ao processo de industrialização. Uma das principais análises realizadas está pautada justamente no crescimento, progresso técnico e no comércio internacional entre as economias dos países industrializados e a dos países especializados em bens primários.
Essa é a distinção que a CEPAL faz com relação aos países "periféricos" e os "cêntricos". Esse debate foi um dos primeiros realizados pela CEPAL, logo nos textos inaugurais., no final da década de 1940 e início da década de 1950. Neste sentido, três pontos foram importantes para a discussão: a estrutura subdesenvolvida de produção e emprego dos países "periféricos" impedia essas nações de reter os frutos de seu próprio progresso técnico, que era algo que não acontecia com os países "centrais"; o excesso de mão-de-obra na agricultura subdesenvolvida dos países "periféricos" proporcionava a expansão da oferta dos produtos exportados, que reduzia os preços internacionais; mesmo acontecendo o processo de industrialização dos países da periferia, ainda existiria a vulnerabilidade externa por conta do longo período em que a economia desses peíses se manteve sustentada a partir da condição de exportador de produtos primários.
Outra discussão inicial importante da CEPAL foi com relação as condições estruturais internas dos países "periféricos" para o desenvolvimento do processo de industrialização. Pois esses países possuiam uma base econômica agrícola e especializada em poucas atividades de exportação. Além disso não havia um desenvolvimento tecnológico adequado, infraestrutura, existia a insuficiência de poupanças e divisas, o desequilíbrio estrutural do balanço de pagamentos, inflação e desemprego. Eram desafios que precisavam ser superados para que pudesse haver um progresso técnico suficiente para impulsionar o desenvolvimento econômico e social da periferia.
Nos diversos momentos de avaliação conjuntural da CEPAL, o Estado é tido como um ator que tem um papel fundamental no processo de desenvolvimento estrutural da produção, geração de emprego e distribuição de renda nos países. Mas para que isso aconteça é necessário que haja um planejamento econômico e social pautado a partir da análise das condições e perspecivas macroeconômicas e microeconômicas, que tenha o objetivo de apontar para o crescimento.


segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Principais pontos do Plano Real

Uma das principais medidas para a implantação do Plano Real, em julho de 1994, foi justamente a construção de um momento anterior com a instalação da Unidade Real de Valores (URV), de março a junho de 1994, com o objetivo de realizar a conversão monetária, inclusive com relação a questão salarial. Mas foram necessárias duas condições para a implementação do Plano Real: a constituição de reservas internacionais e o equilíbrio fiscal.

As primeiras medidas econômicas do Plano Real foi a implantação do Real como moeda nacional, o alinhamento dos preços relativos com o objetivo da abertura do mercado e a praparação para o processo das privatizações. Após alguns anos do Real, o alinhamento dos preços relativos resultou no declínio dos preços dos bens industrializados e o aumento dos preços de serviços, públicos e privados. Além disso, outra medida foi a manutenção das altas taxas de juros nominais internas com o objetivo de constituir reservas internacionais expressivas, num primeiro momento e, num segundo à sustentação de uma taxa de câmbio apreciada num contexto restritivo de financiamento externo. Também houve a indexação da taxa de câmbio à inflação, principalmente por conta da crise do México.

Até 1996, houve um aumento de consumo das famílias por conta da propensão ao endividamento resultante da estabilidade para a realização do cálculo do valor dos compromissos financeiros. A partir de 1997, principalmente com a deteriorização das condições internacionais por conta da crise asiática, as taxas de juros ficaram num patamar elevado, ocasionando o crescimento do risco-país, uma desaceleração do consumo e a redução da renda dos trabalhadores e trabalhadoras.

Outra questão é com relação ao déficit da balança comercial, proporcionada pela crise internacional e manutenção das elevadas taxas de juros e porque a pauta de exportação do Brasil era baseada nas exportações de commodities. Até 2002, o país também teve um crescimento reduzido por conta da elevada carga tributária e corte de gastos públicos. Não foi efetuada uma política que previlegiasse o investimento produtivo para que pudesse gerar emprego, aumentar o consumo e movimentar a economia. Além disso, houve o aumento da dívida pública interna, principalmente por conta do endividamento do país junto às instituições multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial, que fez também expandir a dívida externa. Outro ponto importante para o crescimento da dívida externa foi a crescente desvalorização do câmbio. Vale ressaltar ainda que o dinheiro oriundo das privatizações das empresas estatais não ajudaram a resolver o problema do endividamento do país e nem contribuiu para a melhoria da qualidade de vida da população.






sábado, 6 de agosto de 2011

Será que é o momento do socialismo?

A compreensão do neoliberalismo deve passar antes por uma avaliação do contexto do modo de produção capitalista em que o modelo neoliberal foi implementado. Isso remete ao período posterior a crise de 29, quando alguns países se reestruturaram economicamente a partir de uma política keynesiana, principalmente os países capitalistas mais desenvolvidos da época: Estados Unidos e Inglaterra. Vale ressaltar que o modelo apresentado por Keynes não foi totalmente posto em prática pelas economias capitalistas daquele período, mas a principal abordagem da sua teoria, a intervenção estatal na economia, compôs a metodologia adotada pelos capitalistas para combater a crise que teimava em não passar com as medidas defendidas pelo mercado.



Mesmo com a crise de 1929 os Estados Unidos permaneceu com poder em relação aos demais países capitalistas e o dólar como moeda internacional tendo como lastro a reserva de ouro americana, que representava dois terços da reserva de todo o mundo. Nos anos 50 os EUA ajudaram na recuperação da Europa e do Japão, principalmente por conta da disputa com os comunistas. Já nos anos 60 houve o crescimento do Japão e dos países da Europa que receberam ajuda norte-americana e eles passaram a disputar mercado com as demais potências mundiais, construindo um mercado financeiro forte e competitivo fora dos EUA. Esse processo gerou uma inflação em dólar e uma liquidez de dólar no mercado internacional.


A inconversibilidade do padrão dólar-ouro, em 1971, foi uma das primeiras atitudes dos EUA para combater o avanço das demais potências, mas também foi uma década marcada pelo descontrole da taxa de câmbio e do fluxo de capitais. Em 1973 veio a crise do petróleo e os EUA foram os grandes prejudicados porque eram os maiores importadores do produto, que passou de U$ 3,00 para U$ 30,00 em seis anos. A consequência disso foi uma das maiores crises que afetou diretamente um dos setores mais importantes da economia norte-americana, o automobilístico. Também houve um efeito em cadeia e os demais setores produtivos sofreram um grande impacto, interferindo diretamente na classe trabalhadora com a redução de salários e geração do desemprego. Já que os EUA também consumiam em grande quantidade demais produtos de outros países, a crise norte-americana interferiu no processo produtivo mundial, fazendo com que a crise alcançasse também um patamar importante nas demais economias capitalistas do mundo.


Em 1979, o EUA estabelece a diplomacia do dólar forte e eleva os juros de 7% para 21% com a intenção de financiar o aumento da dívida americana. A medida acentuou a sobreposição do capital financeiro com relação ao capital produtivo e diversas empresas foram transferidas para outros países em busca da redução dos custos de produção. Foi o início da liberalização financeira e quando a economia de outros países, como a China, começaram a crescer de forma considerável.


A conjuntura da crise da década de 1970 foi o ponto de partida para que os defensores do neoliberalismo responsabilizassem o Estado e os sindicatos pelos acontecimentos e propusessem a superação da política econômica keynesiana. Para eles, a intervenção do Estado na economia aliada a carga tributária impediam o livre mercado e limitavam um dos principais componentes para o crescimento de uma economia, a concorrência. Já os sindicatos limitavam as liberdades individuais ao evitar que as pessoas escolhessem os contratos de trabalho que mais lhes interessassem e também interferiam diretamente no processo de regulação automática da oferta e demanda por postos de trabalho pelo mercado, através da regulamentação dos mercados de trabalho, do aumento de salários e da reivindicação de diretos trabalhistas.


Como apenas a crítica superficial ao modelo anterior não seria suficiente para sustentar a implementação do neoliberalismo, o discurso neoliberal também foi sustentado pela promessa de retomada do crescimento dos países estagnados há anos, a ampliação da competitividade em economias frágeis, pelo combate à pobreza e a redução das desigualdades em países marcados por diferenças sociais relevantes. Portanto, a retomada do crescimento aliada ao combate a pobreza e a redução das desigualdades foram os principais argumentos abordados para a inserção da lógica neoliberal na ordem internacional. Mas todos esses argumentos têm como essência a defesa da liberdade dos indivíduos e a livre atuação do mercado. O neoliberalismo reconstrói o discurso das liberdades individuais e o argumento é vinculado aos valores. O Estado e os sindicatos eram instituições que limitavam as liberdades individuais.


O neoliberalismo começa a ser construído ainda na década de 70, sendo constituído como um sistema distinto de regulação política, econômica e social. A partir da perspectiva neoliberal, o Estado seria responsável pela garantia da propriedade privada e dos contratos, além do funcionamento de setores como a justiça, a segurança e a própria parte administrativa do governo. A economia deveria ser controlada unicamente pelo livre mercado e a intervenção estatal não seria admitida. As políticas sociais deveriam ser mínimas ou apenas o necessário para controlar uma parte mais desfavorecida e insatisfeita da sociedade.


O processo chamado de reestruturação produtiva também começou a ganhar forma a partir da década de 70, sendo apoiado na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e dos padrões de consumo. Ele foi caracterizado pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novos mercados, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e a intensificação de inovação comercial, tecnológica e organizacional com a intenção de reduzir custos e influenciar tanto qualitativamente quanto quantitativamente no processo de produção. Regiões subdesenvolvidas começaram a receber uma grande quantidade de indústrias multinacionais, houve o desenvolvimento no emprego no chamado setor de serviços e a expansão do processo de terceirização da mão-de-obra. Além disso, um dos principais acontecimentos foi o processo de privatização das empresas estatais. A crise da década de 70 gerou uma grande volatilidade do mercado, do aumento da competição e do estreitamento das margens de lucro das empresas, que tiraram proveito disso para impor regimes e contratos de trabalho mais flexíveis, aproveitando a instabilidade do poder sindical e o grande número de desempregados.


O poder econômico das empresas privadas foram suficientes para pressionar o Estado e flexibilizar a regulamentação de direitos trabalhistas, assim como a proteção social dos trabalhadores e trabalhadoras, com a promessa de que a regulação automática do mercado sobre a oferta e demanda de postos de trabalho seria suficiente para alcançar um patamar próximo do pleno emprego e isso se daria principalmente através da regulação dos salários e da capacitação individual de cada trabalhador ou trabalhadora. No entanto, as décadas de 80 e 90 comprovaram que as medidas neoliberais geraram mais desemprego e fizeram com que o trabalho fosse ainda mais precarizado a partir do processo de terceirização.


A crise internacional atual não é apenas fruto das medidas adotadas durante a crise de 2008, mas também daquelas que foram adotadas para combater a crise da década de 1970. A partir do impacto ocorrido em cada país, tanto em 2008 como agora, há o mesmo princípio que foi adotado com a crise de 70, com o investimento para o fortalecimento das instituições financeiras ao invés do investimento no setor produtivo, que gera emprego e incentiva o consumo e a produção, proporcionando o efeito multiplicador na economia. A última medida norte-americana para combater a atual crise foi o aumento do teto da dívida em 2,4 trilhões de dólares e o corte de gastos na mesma proporção para evitar que a maior economia mundial desse um calote inédito. Mas não se fala em qualquer tipo de investimento produtivo do Estado para gerar mais emprego e equilibrar o mercado interno. Além disso, a crise atingiu de forma direta alguns países da chamada zona do euro, como Grécia, Espanha, Portugal e Itália e que também não apresentaram até agora qualquer tipo de medida concreta para o investimento produtivo. Como não há perspectivas, em um curto prazo, de superação da crise e sim a expectativa de que ela se agrave, o governo chinês já está sugerindo a possibilidade de uma nova moeda internacional em substituição ao dólar.